domingo, 7 de junho de 2015

Tranças

Tranças. Toda a nossa vida se esboça no entrançado do teu cabelo.
Passas-lhe os dedos uma, e outra vez. Começando sempre pelas pontas, subindo bem devagar, até ao cocuruto quente.
Teces. Usa-as de todas as formas. Uma atrás, duas presas acima da cabeça, parte presas, parte soltas, apenas um apontamento ou com mechas fugitivas.
Gosto particularmente quando as fazes corridas, uma para cada lado, emoldurando-te o rosto belo.
Até eu já as sei fazer. A de fora, sempre para o meio, uma e outra vez.
Sei que não estás bem quando acordo, e não as vejo já em ti, impecavelmente feitas, o cabelo já domado. Algo te incomoda, ou apoquenta, se não as usas. Se o usas com um rabo-de-cavalo, é porque tens já a cabeça demasiado cheia, demasiado pesada para ostentações.
Desfaço-as, quando me deixas, e esqueço-me sempre como o teu cabelo é bonito. Sempre mais comprido do que aquilo que me recordo. Alvo, ondulado, com um perfume tão próprio. Roubo-to da covinha atrás do pescoço, enquanto dormes, enquanto sonhas.
Um dia, hás-de sentar as nossas filhas em teu colo e aprisionares-lhes os medos, como fazes com os teus. Controlando as inseguranças tuas, em gestos automáticos. Mãos treinadas e sapientes, que acariciam e amordaçam as dúvidas, que não precisas de ter. Mantem-no solto. Não tens de ser sempre forte.

(Café Contexto 23/52)

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