domingo, 15 de novembro de 2015

Nunca fui religiosa porque nunca soube bem a quem rezava. Sempre senti que não precisava de símbolos, de templos, de orações ensaiadas. Havia sempre algo historicamente contraditório no que me contavam. Algo que me era estranho, que não fazia sentido. Algo que catalogava. Algo que desunia. Actos não pensados, obediência às cegas, extremismos. Separei a religião da espiritualidade já há muito tempo. Porque sempre senti que existia algo mais. Acredito na fé, sim. Ainda acredito na humanidade. Dia-a-dia. Todos os dias. Interessa mesmo baptizar um Deus? Para mim todos somos iguais ao seus olhos, mas diferentes pela maneira como lhe escolhemos rezar. Por que criar assim tantos conflitos? Deus não cria guerras (santas), os homens sim.
 
(Café Contexto 46\52)

domingo, 8 de novembro de 2015

Escuridão

Negrume.
Perda de interesse, baixa autoestima, desencorajamento.  Disforia, inutilidade, tristeza extrema.
Pensamento perturbado, abatimento moral. Pessimismo, irritabilidade.
Fadiga fácil, cansaço constante, prostração física.
Choro. Ansiedade e culpa. Sofrimento e solidão. Sono, entorpecimento...depressão.

(Café contexto 46/52)

domingo, 1 de novembro de 2015

Vento

Era velho, vento, pai. Percorrera os quatro cantos do mundo. Por onde passara, deixara sementes, criara raízes. Filhos, muitos filhos. Um continuar de geração, descendência quase espontânea. Ventinhos arrepiantes, quentes, ardentes, de boas promessas, de bons casamentos.
Educava-os sozinho, de mão bem firme, de palavra bem posta. Com arejos tão atrevidos, necessário andar a toque de caixa. Reguilas, por vezes. De asneiras, bem frequentes. Tão irrequietos, tão agitados, trabalhos dobrados, de filhos já criados. Desconhecendo já, como repreendê-los, enterrava-os nas dunas. Só lhes sobravam os cabelos.


(Café Contexto 44/52)

Fotografia de JPedro Martins