domingo, 15 de fevereiro de 2015

Azul

Vinte centímetros. Vinte centímetros, apenas. A amplitude do meu mundo reside em vinte centímetros. Para lá, tudo é uma névoa difusa. Um ambiente de nevoeiro e de sombras. Os contornos inexistentes. As linhas inexpressivas. Um borrão de tintas. Pinturas a aguarela.
Distâncias. Céu, estrelas, aviões, horizonte. Tudo enublado para lá dos vinte.
Um mundo subaquático e insípido.
Amarrar alguém. Os olhos mais iguais aos azuis morreram já quase cegos, dependentes de outros castanhos. Sujeição. Os meus não se prendem com dioptrias, mas com a indolência de um nervo. Não sou invisual, e sou grata por isso, mas condiciona-me. Não me reconheço ao espelho porque os meus olhos não chegam lá. Não me lembro dos joelhos e acho que não tenho dedos dos pés.  Quando os olhos falham, o foco passa naturalmente ao próximo. Como não observo, observo-me. Direcciono-me ao já apreendido, ao já confortável, ao já em mente. Alma gentil por vezes. Devaneios frequentes. Intelecto complicado. De evitar andar sem ajudas oculares, pois o meu pensamento é bem menos concreto do que o abstrato do real.

(Café Contexto 7/52)

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